quinta-feira, 21 de junho de 2012

Abertura do Cenas Curtas

por Bruna Cris


De 30 de maio à 03 de junho de 2012 o Galpão Cine Horto realiza o 13º Festival de Cenas Curtas que apresenta 20 cenas de 15 minutos cada. Esse ano a superstição entra em cena, por conta da mística que envolve o número treze (comumente ligada a azar). E o Galpão se debulha sobre esse tema e capricha na decoração, logo no corredor uma escada, em que o público tem de passar por debaixo dela. Gato preto e outros símbolos ligados à sorte ou azar estão no espaço.

A cena inicia ainda na fila, com uma intervenção da atriz Denise Leal (Macaxeira) que passa na ‘rua’ vendendo uma cachaça com uma cor avermelhada, segundo a personagem, por conta da jabuticaba. Uma intervenção que me deixou intrigada pelos primeiros 5 minutos após perceber a sua presença, mas que me alertaram para o uso de aparelho. Eu, particularmente nunca vi um mendigo usando aparelho. Matamos a charada, antes mesmo dela se aproximar de todo o grupo que esperava ansioso pelo primeiro dia de Festival.

A primeira cena, A Noite Devora Seus Filhosuma narrativa de uma mulher e uma construção e desconstrução de cenário. Uma luz suave e um abajur que traz uma bela iluminação, mas que é pouco explorada. Uma luz que ilumina o geral da cena e que é pontual em alguns momentos, essa sim é melhor explorada.

Um cânone desentoado? Talvez apenas uma troca de liderança! A atuação de Renata Cabral e Glaucia Vandeveld condiz ao texto, num casamento quase perfeito, digo quase por um detalhe de um texto interrompido em um momento, um erro? Talvez. Mas fica imperceptível se olharmos o todo.

O Hospício somos nós teve um jogo entre as atrizes Camila Morais e Dayane Lacerda que me fisgou logo na cena inicial, três bancos, uma atriz à véspera do suicídio, uma boneca no centro e um grito enclausurado no corpo (minha livre interpretação da segunda atriz).

Me peguei incomodada apenas com a manipulação dos objetos, em certos momentos passou a impressão de não ter completo domínio dos mesmos, e até por empolgação com o feedback da plateia, no momento em que Maura é dilacerada perde-se o poder de manter os objetos dentro do espaço proposto à cena, por exemplo. Mas tem-se uma discussão levantada, o que é loucura e o que é normal?

Precisa-se de Artistas surpreendeu-me. Um cenário simples e composto por elementos o suficiente para se apresentar a cena riquíssima e cheia de provocações. Uma possível entrevista para se preencher a vaga em aberto e a placa que mais me prendeu á cena com os dizeres Precisa-se de artistas mesmo título da cena. Me trás à reflexão do que é preciso para se intitular como tal?

Herbert Tadeu, Raul Starling, Pollyana Costa Santos e Jussara Fernandino despertam várias possibilidades de se preencher tal vaga. E foi na junção de todos eles em prol de “um pulo à imortalidade” me fazem perceber, ou mesmo sentir, já que não consigo transmiti-lo nessas linhas, o que é esse despertar artístico. Uma luz simples e que condiz com a proposta me repercute as entrevistas diárias para se preencher espaços vazios. Uma cena concisa e que me desperta ao calar-me, deixar-me sem palavras para conseguir descrevê-las. As coisas que não existem eu faço desaparecer...

Digam o que é preciso para ser artista. E eu repito a questão levantada: O que é preciso para ser artista?

Quinze Centímetros inicia com projeções e uma coreografia que remete ao tango. Uma dança ritmada perpetua-se no espaço com variações interessantes de passos. A guerra dos sexos se faz presente ao perceber-se que a mulher tenta ao máximo ridicularizar o homem até que o mesmo não seja nada além dos quinze centímetros que importam no homem.

Alexandre Hugo e Bruna Betito se deliciam na cena, embora assombrados por alguns tropeços de texto (um explicitado inclusive). A luz, principalmente advinda das coxias laterais, me remete ao caminho a se percorrer. Porém a localização do projetor e do computador (ligado a ele) me incomodaram pela luz que vazava, talvez pensar em camuflar esse aparato possa ser uma boa saída. Ou talvez eu deva sentar-me em outra cadeira.

Enfim, percebe-se que o Cenas Curtas inicia com o pé direito e sobressai às superstições que o número treze traz consigo!

As Tetas de Tirésias levanta várias questões a serem discutidas, como a submissão da mulher e inversão de liderança.  Mesmo sendo apenas mulheres em cena, a posição do homem se faz presente. Com detalhes do cangaço a encenação que me pareceu repleta de elementos e com poucos aprofundamentos em elementos particularizados. Embora em determinado momento a fumaça tenha resolvido compor a cena lindamente, se esvaindo num plano mais baixo, com uma luz verde e a música tomando conta e trazendo um ambiente inusitado. (trabalhar com fumaça em cena é assumir um desafio, pois não se sabe como ela irá se dissipar). Cores fortes e fumaça entre atos fazem-se presentes, e são um bom elementos a serem explorados, mas a atuação e a intensidade de algumas cenas podem ficar mais explícitas e ainda mais potentes.

Acorda, Amor! foi um capítulo à parte nessa noite. Uma atriz em cena, e nos primeiros 30 segundos eu esperava entrar mais alguém no palco. Porém, ficaria pequeno contracenar com Florencia Santángelo que sozinha e sem muitos aparatos (conta apenas com um acordeon e um isqueiro) movimenta-se com tanta leveza e ao mesmo tempo tanta voracidade pelo espaço que por vezes me vi deslocando como ela em cena, eu internamente e ela tomando conta de todo o espaço cênico!

Uma releitura de A Bela Adormecida recheada de expressão corporal. Detalhes que fazem toda a diferença e que compõe a cena com uma unidade que eu particularmente vi poucas vezes. A atriz explora pouco das nuances de luz, utiliza um foco ou geral em luz branca e, algumas vezes, utiliza o tom azul que traz uma sensação mais calma. Embora pouco diferenciada, dialoga com a cena. Mas em compensação, a interatividade com a plateia se faz presente. Ao gritar viva a princesa, espera um retorno que não acontece, então explicita o jogo e o repete, em tom de risos e contentamento a plateia responde com entusiasmo.

O que não vaza é pele levanta questões ligadas ao racismo em jogo com a subjetividade de uma narrativa de Uma pessoa de cor em Clarimanha. Advindo de uma ação policial agressora contra um negro, Alexandre de Sena, dentre várias outras pessoas também no local, os policiais agrediram apenas ele.

E a injustiça e transgressões dos direitos que o ser humano passa a se acostumar tomam conta do local, em forma de invasão do ‘público’ que traz a tona algumas manifestações que fizeram parte do cotidiano de muitos durante esse ano e final de 2011. Placas com os dizeres Moradia é um direito , pontos pra cultura não andar em BH , respeito pelo povo de rua, meu corpo, minhas regras, além de manifestações incrustadas ao corpo de cada um dos mais de 10 que ocupam a cena.

O suspense de Sinto muito: acabaram-se os pães inicia-se quando colocam uma escada e descem um balanço (cerca de três metros do chão) Eu não acredito que ela vai subir naquele balanço, ouvi ao meu lado. E sim, a cena se passa no diálogo de uma menina – sentada em seu balanço – e seu peixinho – num aquário de cerca de dois metros por 40 cm – repleto de água e com a atuação linda dos atores Carol Oliveira e Rafael Lucas Bacelar.

Desde o início me perguntava, por que tem um microfone ali do lado, e porque essa luz tímida, mas existente ali? Minha inquietação só é sanada no fim com uma canção entoada por Marcelo Veronez. Otavio, o peixe, precisa migrar para se alimentar e conhecer o mundo, porém Irene o quer perto dela, e a trama se desenvolve nesse enlace feito pelo amor, mas muito presente também a fome. Eu te amo e tô com fome, que Otavio diz frequentemente, esclarece brilhantemente essa conclusão. A luz pontual também conta um pouco de história, trazendo o público para uma emoção mais próxima à sugestão da cena.

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